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Eliane Brum: omissão e tolerância permitem o avanço do totalitarismo no Brasil

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Wilson Nogueira

Em palestra para leitores em Manaus (AM), a jornalista e escritora Eliane Brum disse que escreveu o livro Brasil construtor de ruínas: um olhar sobre o País de Lula a Bolsonaro, para recuperar o processo [da histórico] do País. O evento foi realizado pela Banca de Livros Amazônicos do Largo de São Sebastião e pelo portal Amazônia Real.

“[…] Se a gente está, neste momento nesse atoleiro, nessa escalada de autoritarismo no Brasil, uma das causas disso é a nossa desmemória”, afirmou.

E se isso está acontecendo no momento é porque, segundo ela, “[…]há uma maioria de pessoas que se omite e de pessoas que toleram.”

Ela explica que o “Brasil não fez memória dos crimes da ditadura, o que faz com que hoje um torturado, ou a família de alguém que foi assassinado pela ditadura militar, possa se encontrar na padaria da esquina com um torturador, ou assassino, e não poder fazer nada”.

Para ela, a democracia brasileira “já nasceu com a alma deformada, porque não fez a memória dos crimes de estado”.

E mais: “ e [a democracia] continua se deformando, porque, além de não fazer memória dos chamados crimes políticos, cometidos por agentes de estado, continua compactuando, continua tolerando a tortura e os crimes cometidos contra as pessoas, principalmente contra a população negra, na periferia das grandes cidades”.

Ao mesmo tempo, os presos que se chamam “comuns”, enfatiza a jornalista, continuam sendo torturados nessa democracia deformada”.

Eliane Brum também falou sobre como imagina que as pessoas devem se posicionar diante do recrudescimento do autoritarismo e da experiência que vive no sul do Pará, a partir de Altamira, para mobilizar ambientalista do Brasil e do mundo para o movimento Amazônia centro do mundo.

 

Trecho da palestra:

Acho que o fato de não ter feito memória da ditadura, que outros países fizeram, tem um efeito direto naquilo que a gente está vivendo hoje.

A partir dessa percepção, faço esse livro também por isso, pra fazer memória, pra contar, onde quer que seja, a memória do tempo presente, pra contar essa vida de espasmos e poder recuperar o processo, e poder entender o que, talvez, seja o mais difícil: contar tudo o que a gente está vivendo – o que é ruptura e o que é continuidade.

No meu livro, procuro apontar o que é ruptura, o que é continuidade, e coloco a questão da Amazônia no centro porque a Amazônia é o centro.

A gente vive hoje claramente um acirramento da escalada autoritária.

Não vai melhorar, vai piorar.

E cada um aqui e cada um nesse país vai ter que saber como se posicionar, e o que vai fazer dentro disso.

Quando o Guedes fala no AI-5, quando o Eduardo Bolsonaro fala no AI-5… O AI-5 já está nas periferias, já está na Amazônia.

Nesse momento, em menos de quarenta dias, três indígenas do povo Guajajara foram assassinados.

A gente teve os nove assassinatos de Paraisópolis, jovens que estavam se divertindo, mas como são pobres e negros morreram pisoteados.

A gente teve o [assassinato do] Márcio, uma das testemunhas do padre Amaro, que é seguidor do trabalho de Dorathy Stang, assassinada em 2005. [Márcio] foi assassinado em Anapu, mais um assassinato em Anapu.

Anapu fica a duas horas de Altamira, onde a Dorathy foi assassinada. Tem uma trilha de morte e nada aconteceu.

A gente está começando a viver as prisões autoritárias, como aconteceu em Santarém. Prenderam os brigadistas. Completamente absurdo.

A gente está vivendo a criminalização das ongs, como aconteceu com Saúde Alegria.

Tudo isso são coisas muito recentes.

Se a gente for falar de tudo que aconteceu nesse ano, a gente passa a noite inteira, amanhã o dia inteiro aqui…

Então, a gente está vivendo uma escalada autoritária e nada indica que isso vá reverter.

E a gente tem uma questão muito importante: o que fazer?

Se a gente observar a história, há uma minoria que apoia explicitamente o autoritarismo. O autoritarismo só se impõe, porque há uma maioria de pessoas que se omite e de pessoas que toleram.

Tem uma pesquisadora alemã […] que escreveu um livro sobre isso […] e ela dá o nome para essas pessoas, que foram as pessoas que permitiram o nazismo […] de amnésicos, então são pessoas, entre aspas, comuns.

O autoritarismo não seria possível se a maioria de nós não se omitisse ou tolerasse.

Acho que a gente precisa pensar sobre isto: seríamos nós os amnésicos desse momento do Brasil?

Aí, eu queria contar um pouco do que eu estou fazendo, porque a gente está no momento que […]tem que fazer o que a gente não sabe.

O que a gente sabe já não é suficiente. A gente tem que inventar as coisas que não existem, tem que fazer também o que a gente não sabe, e cada um de nós tem que saber como é que se faz o que não sabe fazer.

A gente acabou de viver em Altamira e na Terra do Meio, que é na região do Xingu, o encontro que a gente chama Amazônia centro do mundo.

Esse é um encontro que está aumentando e que a gente faz um chamado para todo o Brasil, para todos os Brasis.

E a gente convidou os ativistas climáticos da Europa, dos Estados Unidos, como o Change Balio, convidou as adolescentes do Friday for Future, por entender que, na época da era climática, a Amazônia é o centro do mundo.

Isso não é retórica. Isso não é frase de efeito.

Vocês moram no centro do mundo. Vocês vivem no centro do mundo.

E a gente não deve mais permitir que nos tratem como se nós fossemos periferia.

A Amazônia é o centro e precisa ser vista como centro.

Nesse encontro a gente quis deslocar. Convidou pessoas do outro lado do mundo a deslocar, e de outros Brasis, do Sudeste e do Sul, a deslocarem seus corpos para o centro, para o centro do mundo.

Em vez de ir para a Europa falar de Amazônia, em vez de ir para os Estados Unidos, em vez de ir para São Paula falar de Amazônia, para o Rio, para Brasília.

As pessoas precisam fazer esse movimento também com os seus corpos: o movimento de se deslocar no centro do mundo, experimentar estar no centro do mundo.

Então a gente fez esse grande encontro.

Primeiro, na Terra do Meio, com ativistas climáticos da Europa, líderes indígenas, intelectuais indígenas, cientistas, grandes cientistas brasileiros, lideranças ribeirinhas, lideranças quilombolas.

Depois, essas pessoas foram para Altamira, onde esse encontro ficou muito maior.

Lá, o encontro Amazônia  centro do mundo foi puxado pelos movimentos sociais da região do Xingu. E foi um encontro extremamente potente, de não apenas reagir, mas de criar futuros juntos.

E só assim, fazendo esse deslocamento do que é centro e do que é periferia, é que a gente pode voltar a imaginar um futuro no qual a gente possa viver, porque o autoritarismo não nos dá [futuro], ele se esgota, ele não tem futuro.

Para apresentar o futuro, o que ele nos apresenta, é a fraudação da história. O futuro que ele nos propõe é um passado que nunca existiu. Isso está acontecendo no mundo inteiro.

Nós precisamos nos colocar, nos dá centralidade e então criamos juntos, imaginarmos juntos um futuro no qual a gente possa viver.

Só juntos, a gente consegue fazer isso.

Esse movimento que se inicia, que está viralizando, a Amazônia centro do mundo, e que todos vocês estão convidados a se unir, é exatamente para isso, para inverter, para deslocar o que é centro, o que é periferia.

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