Parintins ignora poder da mídia espontânea criada por artistas de bois [Por Wilson Nogueira]
Wilson Nogueira*
Mais uma vez, o trabalho dos artistas do boi-bumbá de Parintins (AM) é destacado pela mídia, desde os blogs às transmissões de Rede Globo, nos desfiles das escolas de samba de São Paulo e Rio de Janeiro.
Depois das duas capitais, Parintins é a cidade mais citada nas transmissões da Globo, que detém o direito de imagens dos desfiles para o Brasil e para mais de 150 países por meio da Globo Internacional.
Trata-se da mais abrangente, longa e ininterrupta exposição de imagens e informações sobre uma festa popular brasileira.
O mais importante nesse contexto é que, juntamente com a cidade, o trabalho dos artistas arrasta para o mundo o espetáculo dos bois-bumbás Garantido e Caprichoso, realizado na última semana de junho de cada ano.
Em razão dessa divulgação Parintins, certamente, é hoje a cidade, depois das capitais, mais conhecida da Amazônia.
E se trata de conhecimento por intermédio de visibilidade positiva, cujo atributo é fator o artístico-cultural.
No mundo da mercantilização das coisas, pode-se dizer que Parintins poliu ao longo dos anos – e graças aos seus artistas – um produto que está na mente da imensa maioria dos brasileiros e de pessoas de outros países.
É intrigante, todavia, que gestores do poder público, os de ontem e os de hoje, ainda não tenham percebido que dirigem uma cidade importante.
Talvez, porque ela se destaque via cultura popular, que agora pode ser chamada de via cultural midiática planetária.
Os gestores parintinenses ainda são sujeitos incapazes de compreender o potencial da sua cidade nas decisões políticas que possam vir a beneficiar seus moradores.
Por isso, dependem da política rasteira para amealhar dinheiro público e privado.
Barateiam status diferenciado que se firmou pela cultura popular e se amplia com a implantação do polo de conhecimento técnico-acadêmico mesorregional.
Estão instaladas uma unidade da Universidade Federal Amazonas (Ufam), uma unidade da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e uma escola do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (Ifam), e cursos de universidades particulares.
Não são poucos os estudantes e professores do ensino médio e do ensino superior que, igualmente aos artistas de boi-bumbá, têm se destacado pelo desempenho das suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Parintins não é uma cidade desconhecida.
Ela, por si só, se apresenta ao mundo. O versador não versa à toa: “Sou Garantido sou vermelho ê / De Parintins pra todo mundo ver […]**”
Suas campanhas midiáticas são feitas por parceiros, inclusive os dos governos, que são recompensados com vínculo de imagem positiva.
Parintins permeia, sem exagero, o imaginário do Brasil e, em alguma medida, do imaginário-mundo.
Isso porque é a cidade brasileira que tem a sua imagem colada na representação da Amazônia, haja vista ter se tornado vitrine das diferentes culturas acolhidas na festa do boi-bumbá.
Não se nega, aqui, as contradições existentes no conteúdo do espetáculo, que ainda vacila entre certo conservadorismo e a arte reflexiva.
É só prestar atenção no enredo das escolas de samba de São Paulo e Rio de Janeiro para entender que os bois-bumbás precisam assumir uma voz explícita de crítica social.
Afinal, no mundo da visibilidade midiática a voz dos bois-bumbás não é menos importante que outras vozes.
Até porque a voz da arte é mais poderosa, mais livre, mais criativa e mais bela.
Quanto aos artistas, penso que devem confiar mais naquilo que sabem fazer, que é a arte, e transformá-la em bem compartilhado coletivamente, para que possam, com legitimidade, influenciar debates e decisões de política cultural principalmente.
Assim, ficariam menos vulneráveis a práticas e gestores míopes, incompetentes ou até mesmo corruptos dos seus dirigentes.
Por fim, entendo que Parintins tem potencial para se apresentar – e se fazer representar – com mais firmeza no cenário político-cultural do estado.
*O autor é jornalista e escritor
**Versos da música Parintins para o mundo ver, de Ana Paula Perrone e Jorge Aragão