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Na companhia de Humboldt [Por Wilson Nogueira]

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Ao encerrar a leitura de A invenção da Natureza: a biografia e obras de Alexander Von Humboldt (Planeta do Brasil, 2019), de Andrea Wulf, senti-me impregnado de ideias para o ato de começar.

Fui apresentado a Humboldt ainda na graduação, no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), no começo da década1990.

Reencontrá-lo pelas mãos de Andrea Wulf foi uma grata e edificante surpresa. Penso que sempre ansiei conhecê-lo melhor e, talvez por acaso, dei de cara com esta biografia numa gôndola reservada a obras de Ciências Exatas de uma livraria de Manaus.

Filho de Alexander Georg von Humboldt e Marie-Elizabeth, Humboldt nasceu na cidade de Tegel – na antiga Prússia, hoje Alemanha – em 1769 e morreu em 1859, em Berlim. É caçula do irmão Wilhelm, proeminente linguista e diplomata do reino prussiano.

Sem dúvida, foi o cientista mais celebrado da sua época, não só porque descobriu a natureza como um universo vivo, mas, principalmente, porque agiu e influenciou gerações a agirem por meio dessa nova visão de mundo.

Andrea Wulf, a biógrafa

A escritora entreteceu uma obra que retrata Humboldt na sua profunda ebulição intelectual e encruzilhadas profissionais e existenciais.

Enquanto a maioria dos cientistas da sua época se empenhava em disciplinar a ciência, ele se juntava a outros que pensavam e a praticavam interdisciplinarmente.

Seus colegas se enfurnavam nos laboratórios, Humboldt fazia da natureza a céu aberto um campo de observação in loco, aguçando ainda mais a sua paixão a cada fenômeno revelado.

Mesmo nas suas viagens rotineiras pela vizinhança, nos países europeus, não perdia a oportunidade se embrenhar nos bosques, nas montanhas, a observar as plantas, e a medir altitudes e temperaturas.

A geologia perdeu, logo cedo, um promissor inspetor de minas que vivia atordoado com ideias que não se encaixavam na noção de que os seres vivos funcionavam iguais a máquinas.

Logo após a morte da sua mãe – o pai havia falecido quando ele tinha apenas seis anos –, Humboldt, aos vinte anos, zarpou para o mundo e só parou quando já estava no limite das suas forças.

As impressões de Humboldt acerca de uma nova ciência se tornaram ideias vigorosas após sua viagem à América do Sul, entre 1799 e 1804, na companhia do botânico francês Aimé Bonplant.

Depois de explorar o rio Orinoco e parte do pico Chimborazo, no Equador, então considerado o mais alto do mundo, Humboldt elaborou a sua naturgemälde [“um termo alemão intraduzível que pode significar pintura da natureza”, segundo A.W], pela qual apresenta “um microcosmo em uma só página”.

Ao contrário dos cientistas que classificavam a natureza em unidades taxonômicas, fragmentada, em complicadas tabelas e infindáveis categorias, Humboldt a descrevia em um único desenho, uma forma diagramática de expor o seu pensamento.

Humboldt descobria e descrevia a natureza como “um todo vivo” e “não um agregado morto”.

Estava claro para ele, segundo narra Andrea Wulf, que: “Uma única vida tinha sido despejada sobre pedras, plantas, animais e o gênero humano. Era essa ‘profusão universal com que a vida está distribuída por toda parte’ o que mais impressionava Humboltd.”

Segue a biógrafa: “Humboldt não estava tão interessado em encontrar novos fatos isolados, mas em conectá-los. Fenômenos individuais eram importantes somente em sua relação com o todo”.

A partir dessa cosmovisão Humboldt denuncia a depredação que os países europeus causavam ao ambiente e aos povos das regiões em que exploravam suas riquezas, em geral com mão de obra escravizada.

“[…] O domínio colonial explorava as colônias para extrair matérias-primas e, no processo, destruía o meio ambiente. As diretrizes coloniais eram cruéis e suspeitas […] e a América do Sul foi devastada por seus conquistadores. Sua sede de riqueza levava o abuso de poder para a América Latina”, acentuava Humboldt.


Ele foi impedido de vir ao Brasil por se considerado “espião” pela Coroa portuguesa. Também são atribuídas às suas inferências políticas a não-liberação, pelo governo inglês, da sua expedição ao pico do Himalaia, na Índia.


Não seria de se estranhar que a percepção de Humboldt sobre a natureza viesse a influenciar cientistas, pintores, poetas, escritores e governos. Charles Darwin, por exemplo, se abeberou na naturgemälde para elaborar a sua teoria da evolução das espécies.

Por sinal, dá-nos a conhecer Andrea Wulf, que Darwin, morador do condado de Kent (Inglaterra), coincidentemente, comunicou ao seu editor em Londres que os seis primeiros capítulos de A origem das espécies estavam prontos, no mesmo dia em que Humboldt morria, aos 89 anos: 6 de maio de 1859.

Suas últimas palavras foram estas: “Como são gloriosos estes raios de sol! Parecem chamar a Terra para os céus”.

“Numa perfeita sincronização reversa, à medida que Humboldt passava por um lento declínio, Darwin vinha acelerando o seu ritmo, ganhando fôlego e velocidade, e dava os retoques finais do livro que viria a abalar o mundo”, assinala a biógrafa.

Humboldt se valia dos rigores da investigação científica. Utilizava-se, inclusive, da melhor tecnologia para enxergar, sentir e desvendar as profundezas dos microrganismos e a infinitude das galáxias.

Nem por isso desfez-se das subjetividades, das reações pessoais, do imprevisível ou das possibilidades de erro.

Com isso, apresentou a sua nova visão de ciência em textos elegantes, criativos, poéticos e acima de tudo fiéis ao entendimento de que o pesquisador está em interação com os sujeitos que investiga, porque esses são partes e todo do mesmo universo.

Humboldt criou um novo gênero literário: “Uma combinação de pensamentos com respostas emocionais da natureza”.

Seus livros, entre eles Narrativa pessoal, O homem e a natureza, e Cosmos, atingiram grandes tiragens na Europa e nos Estados Unidos, elevando-o à popularidade e à respeitabilidade ainda em vida.

Além de conselheiro da corte prussiana (função que exerceu porque sua herança esvaiu-se), Humboldt era ouvido por presidentes, monarcas e políticos de todos os matizes, tais como: Thomas Jefferson,  James Madison (presidentes dos Estados Unidos), Napoleão Bonaparte (monarca francês) e o revolucionário Simon Bolívar, que libertou do jugo espanhol vários povos da América do Sul.


Humboldt, embora celebrado em vida, suas ideias não proliferaram como deveriam, menos porque seus métodos de escrita e pesquisa “saíram de moda”, como também sugere a biógrafa, e mais por restrições ideológicas impostas pelas guerras e pelos fundamentalismos religiosos e políticos, principalmente em se tratando da questão ambiental.


No contexto científico, quando Humboldt morreu a ciência avançava na sua versão disciplinar, deixando cada vez mais espaço para o entrelaçamento de dados concretos com a arte, a história, a poesia e a política.

Assim, não seria forçoso dizer que Humboldt é um dos símbolos significativos, por suas ideias a respeito dos desafios da pesquisa interdisciplinar, que perduram ainda hoje.

Por fim, este livro que, a meu ver, é um exercício humboldtiano de olhar o mundo, não deixa de ser um estímulo para se visitar ou revisitar as descobertas cientificas e as ideias de Humboldt.

Foi este o meu desejo ao chegar ao fim deste livro, na companhia de Humboldt por mares, oceanos, rios, montanhas, florestas, desertos e pelos recônditos do universo.

Andrea W., muito obrigado!


*O autor é jornalista e escritor.


*O autor é jornalista e escritor

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