Uma das coisas que mais admiro em alguém é o humor. Nada a ver com a boçalidade.
Alguns me pedem crônicas sérias. Gente… o que fui de séria nos meus textos nesses quarenta e três anos de escritora!
Tão seria que o meu querido amigo, jornalista e crítico José Castelo escreveu que eu provoco a fuga insana, isto é, o cara começa a me ler e sai correndo para o funil do infinito.
Tão séria que provoco o pânico.
E nesta crônica o que eu menos desejo é provocar o pânico… Já pensaram, a cada segunda-feira, os leitores atirando os jornais pelos ares e ensandecidos? Já pensaram o que é isso de falar a sério e dizer por exemplo: que é isso, meu chapa, nós vamos todos morrer e apodrecer (ainda bem que não é apodrecer e depois morrer, o lá de cima foi bonzinho nesse pedaço) , tu não é ninguém, meu chapa, tudo é transitório, a casa que cê pensa que é sua vai ser logo mais de alguém, tu é hospede do tempo, negão, já pensou como vai ser o não-ser?
Tá chateado por quê? Tu também vai envelhecer; ficara gling-glang e morrer… (há exceções, como Bertrand Russel fazendo comício aos noventa, mas tu não é Bertrand Russel).
Até o Sartre, gente, inteligentíssimo, ficou na velhice se mijando nas calças e fazendo papelão… Se o mundo todo pensasse no absurdo que é tudo isso de ser feito de carne, mas também olhar as estrelas, de éter um rosto, mas também ter aquele buraco fétido, se todo mundo tivesse o hábito de pensar, haveria mais piedade, mais compaixão e amor.
Mas quem é que vocês conhecem que pensa?
As mães que nos colocaram no planeta pensaram? Claro que não.
Na hora de revirar os óinho ninguém pensa.
Só seria justificável parir se o teu pimpolho fosse imortal e vivesse à mão direita Daquele.
Mas o teu pimpolho também vai morrer e apodrecer não sem passar por todos os horrores do planeta.
Tá jogando fora o jornal, benzinho?
Então vai brincar de inventar uma nova semântica.
Semântica – Antologia do sêmen
Solipsismo – Psiquismo solitário
Hipérbole – Bola grande
Xenofobia – Fobia de Xenos
Ligadura – Liga das Senhoras Católicas
Ánulo – Filete colocado por sob o bocel da cornija do capitel dórico
Ânus – Pronúncia erra de anus (aves da família dos cuculídeos
Ku – Lua em francês
Cou (Pronuncia-se cu) – Pescoço em francês
Hipocampo – Campo de hipismo
Proclamas – Alvoroço de amas
Misantropia – Entropia do Méson Mi
Democracia – Poder do demo
Paradóxo – Oxiúros em estado de repouso (parado)
República – Ré muito manjada
Bom dia, leitor, tá contente?
Contente – Filho do ente do Heiddegger (informe-se) com Cohn-Bendit (informe-se)
Domingo, 13 de setembro de 1993
Hilda Hilst, em m132 crônicas: Cascos & Carícias e outros escritos ( Editora Nova Fronteira, ‘2018
Jornalista, escritor e sociólogo.
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